Ainda há muito a ser conquistado pelas mulheres em nossa sociedade. Apesar de movimentos fortes, como o empoderamento feminino, ganharem cada vez mais espaço, as desigualdades em relação aos homens no mercado de trabalho e os casos ainda, infelizmente, muito frequentes de feminicídio, mostram que a luta deve continuar. No caso da história das mulheres e acesso à educação no Brasil, a situação não foi diferente.
A história das mulheres na luta pelo acesso à educação
Avaliar a história do acesso das mulheres à educação é um convite à reflexão. Durante muitos anos em nosso país, elas simplesmente não podiam frequentar a escola. Para se ter uma ideia do problema, bem no começo do século XX, a educação feminina atendia exclusivamente às demandas domésticas.
Como ingressaram tardiamente na escola, a educação voltada às mulheres era exclusivamente dirigida aos cuidados com o lar e às famílias. No Brasil Colônia, persistiam as influências de Portugal, que em uma de suas leis estabeleceu as pessoas do sexo feminino como imbecilitus sexus (sexo imbecil), grupo ao qual ainda pertenciam as crianças e doentes mentais.
Excluídas do processo de formação escolar implantado na fase do Brasil Colônia, as mulheres estavam sujeitas a mandos e desmandos a todo momento. Com acesso limitado apenas às aulas de catequese, no século XVII elas passaram a frequentar as atividades vinculadas aos conventos, mas que eram restritas a aprendizados como costura e bordado, além de boas maneiras e ensino religioso.
Uma curiosidade que merece ser registrada: os povos indígenas tomaram o primeiro passo em relação aos questionamentos sobre as diferenças entre homens e mulheres na educação. Por isso, há registros que indicam que Catarina Paraguassu, chamada de Madalena Caramuru, teria sido a primeira mulher brasileira a aprender a ler e escrever – tudo isso, claro, burlando as leis e regras vigentes da época. Ela inclusive teria escrito, em 1561, uma carta ao padre Manoel de Nóbrega.
Lei Geral garante acesso das mulheres à educação
Em nosso país, as mulheres só conquistaram o direito de estudar além do ensino fundamental em 1827, a partir da Lei Geral, promulgada em 15 de outubro. O direito de frequentar uma faculdade veio apenas em 1879 (as candidatas solteiras tinham que apresentar licença de seus pais; e as casadas eram obrigadas a ter o consentimento por escrito de seus maridos). Sem dúvida alguma, isso foi essencial para garantir a emancipação feminina.
Além de garantir o acesso à educação das mulheres, a Lei Geral permitiu a criação de escolas de primeiras letras (ensino fundamental) e é dela que vem a referência à comemoração do Dia do Professor. Entre outras questões, a lei tratava de assuntos como a remuneração de professores e professoras, as escolas para meninas, o currículo mínimo e a admissão de mestres. Apesar de ser sinônimo de conquistas, a medida ainda tinha uma essência discriminatória, afinal, as alunas não tinham acesso a todas as matérias ensinadas aos meninos, como geometria, e as estudantes eram obrigadas a aprender as “artes do lar”.
As instituições de ensino particulares foram as primeiras a garantir o acesso às mulheres. Nessa época, as ordens religiosas foram fundamentais para assegurar a educação feminina. No Rio de Janeiro, por exemplo, o Colégio Imaculada Conceição, mantido pela Companhia das Filhas de Caridade de São Vicente de Paula, tinha, além da rigidez moral da igreja católica, foco nas meninas oriundas da elite da capital fluminense.
Sobre alunos e alunas na mesma sala de aula, é a partir de 1870, com o surgimento de colégios protestantes, sobretudo metodistas e presbiterianos, que pela primeira vez foram admitidas as classes mistas. No mesmo período, nas províncias, foram criadas escolas públicas mistas.
Nessa mesma fase, outra conquista importante na história das mulheres na educação: as professoras tiveram permissão para lecionar para meninos na faixa etária dos 12 aos 14 anos. Essa modificação abriu caminhos para o magistério feminino e as estudantes tiveram liberação para ingressar nos cursos normais.
Por conta de uma demanda crescente por trabalhadores, a mão de obra feminina passou a ser potencializada no final do século XIX. Na época, foi adotado o discurso da “vocação natural da mulher ao magistério”, destacando, entre outros atributos, a ternura.
Apesar de ganharem espaço na educação, as mulheres, na prática, eram discriminadas e não tinham acesso a cargos de comando nas escolas públicas. No ensino elementar, a partir de 1910, elas já eram maioria. Algumas exigências absurdas para as professoras, como o celibato, e a necessidade de serem viúvas ou solteiras eram comuns ainda nas primeiras décadas do século XX.
O acesso das mulheres ao ensino profissionalizante vem em 1881, quando são inauguradas, no Rio de Janeiro, as primeiras classes nesse formato no Liceu de Artes e Ofícios. As turmas, no entanto, ainda reforçavam as ideias limitadoras ao papel feminino em sociedade, ou seja, quase todas voltadas à rotina doméstica. Pouco mais de uma década e meia depois, em 1897, era fundado, na capital carioca, o Instituto Profissional Feminino.
Um marco na luta pela igualdade feminina no Brasil na história das mulheres, em especial no que se refere ao acesso à educação, é a publicação, em 1832, do livro “Direitos das Mulheres e Injustiças dos Homens”, de Nísia Floresta. A autora não se intimidou e encarou tradições e costumes da sociedade para lançar a obra, que contestava o mito da superioridade masculina e colocava em xeque a visão deturpada sobre a capacidade intelectual e liderança feminina.
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Novos voos na história das mulheres na educação
Após a conquista do acesso ao ensino superior, as mulheres não mais retrocederam no que diz respeito à educação. A participação delas cresceu exponencialmente e tem tudo para se intensificar ainda mais nos próximos anos.
A publicação Education at a Glance (EaG), de 2021, desenvolvida pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), aponta que as mulheres têm mais chances de fazer o ensino superior do que os homens. Por outro lado, elas têm menos chances de serem empregadas. O relatório aponta que, nas nações integrantes da OCDE, inclusive o Brasil, em média, 80% das mulheres com ensino superior (com idades entre 25 e 34 anos) estavam empregadas em 2018, enquanto os homens representavam 87%.
Um levantamento do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), de 2000, retrata uma guinada da história das mulheres na área da educação. “A década de 1990 marca a virada das mulheres brasileiras, que ultrapassaram os homens em nível de escolarização. A proporção de pessoas analfabetas já é significativamente menor entre as mulheres do que entre os homens em todos os grupos com até 39 anos de idade. As mulheres também superaram os homens em número médio de anos de estudo e, nas salas de aula, reinam absolutas: 85% dos 1,6 milhão de professores da educação básica em todo o país são do sexo feminino”, ressalta o documento.
Por falar em números, o Censo da Educação Superior de 2016 revelou que as mulheres representavam 57,2% dos estudantes matriculados em cursos de graduação. Na docência, por sua vez, de acordo com o mesmo levantamento, elas são 45,5%. O Censo Escolar 2018 também mostra que elas são líderes entre os professores da educação básica (cerca de 80%).
No blog do SAE Digital, há um post muito interessante mostrando a trajetória de mulheres que transformaram a educação no Brasil. A publicação destaca a atuação de nomes como Cecília Meireles, Joana Félix, Bertha Lutz, Maria Teresa Mantoan, Thaisa Storchi, Mariazinha Fusari, Ester Cerdeira Sabino e Jaqueline Goes de Jesus.
Desafios do acesso das mulheres à educação
Infelizmente, apesar de tantas conquistas, a realidade mundial do acesso à educação feminino ainda enfrenta muitos desafios. De acordo com uma pesquisa da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), de 2017, 62 milhões de meninas deixaram de frequentar a escola por conta do trabalho infantil, pobreza, fome, casamento precoce, entre outros problemas. A entidade lembra que dois terços dos mais de 750 milhões de analfabetos no mundo são mulheres.
De acordo com informações da organização internacional Care, uma criança que nasceu de uma mulher alfabetizada têm 50% mais chances de sobreviver além dos cinco anos. Como afirmam vários especialistas, os baixos índices de educação feminina têm relação direta com as taxas de mortalidade infantil.
A economia, ainda de acordo com o estudo da CARE, também é beneficiada com o acesso das mulheres à educação. Nos países em desenvolvimento, caso fossem ensinadas as técnicas básicas de leitura, mais de 170 milhões de pessoas deixariam a miséria. Melhorando esse indicador, as economias desses países teriam um crescimento de 2% ao ano.
Vale registrar um outro dado, dessa vez fruto de uma pesquisa capitaneada pelo Banco Mundial. De acordo com essa análise, cada ano adicional de estudo finalizado por uma menina assegura a ela um salário 20% maior quando adulta.
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Celebrar as conquistas das mulheres na educação é também reconhecer a necessária evolução da sociedade em busca da justa igualdade de oportunidades e do fim das diferenças entre os gêneros. Essa trajetória de lutas também deve servir de combustível para superar os inúmeros obstáculos e desafios da atualidade. O desafio está lançado!
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Imagem: Freepik
Muito bem, ótima matéria, as mulheres devem sempre agradecer por poderem estudar, eu gosto muito, sou grata!
Os estudos mudaram minha vida e minha visão de mundo.
Olá Paola! Que bom que gostou! Continue acompanhando o Blog. Temos novidades toda semana!